PACOTE DE RESSUCITAÇÃO

Assim como em outras doenças, como parada cardíaca e trauma, a eficácia do tratamentoda sepse também depende do tempo.

Este artigo destaca o atendimento inicial de pacientes com sepse grave ou choque séptico. A partir da suspeita clínica, medidas iniciais devem ser instituídas o mais rápido possível, buscando contemplar todas as recomendações dentro das primeiras 6 horas de atendimento.
A seqüência apresentada aqui obedece à lógica de atendimento basea da em prioridades e nas intervenções diagnósticas/terapêuticas tempo-dependentes. A coleta de dados da campanha também obedece à mesma seqüência.

1. Lactato sérico

1.1 Recomendação

Recomendamos medir rapidamente o lactato sérico em todo caso suspeito de sepse grave (mesmo sem hipotensão).

Recomendação forte

1.2 Fundamentos

A hiperlactatemia está presente nos pacientes com sepse grave ou choque séptico e é provavelmente secundária ao metabolismo anaeróbico da glicose em um contexto dehipoperfusão. O nível sérico de lactato tem valor prognóstico bem estabelecido nos pacientes com choque séptico, particularmente se os níveis elevados forem persistentes. Adicionalmente, esses níveis têm maior valor prognóstico que as variáveis derivadas da oferta de oxigênio. Dosar o lactato é essencial para identificar hipoperfusão tecidual global nos pacientes que ainda não estão hipotensos, mas que estão sob risco de desenvolver choque séptico. Do ponto de vista de prognóstico, hiperlactatemia e hipotensão arterial persistente têm o mesmo valor.

1.3 Limitações

A interpretação dos níveis sangüíneos de lactato não é sempre precisa. Alguns estudos sugerem que níveis elevados possam resultar mais da falência no metabolismo celular que da hipoperfusão global. Os níveis de lactato elevados também podem ser decorrentes da depuração reduzida pelo fígado ou por inibição do piruvato desidrogenase induzida pela endotoxina. Entretanto, mesmo com essas limitações, em um contexto de sepse de início recente, existem evidências tanto clínicas quanto experimentais de que essa elevação dos níveis de lactato deve ser conseqüência de hipoxia tecidual. Da mesma forma, existem evidências contundentes de que a sua redução precocemente na evolução da sepse tem relação com menores taxas de mortalidade. Dessa forma, recomeda-se reduzir os níveis de lactato para níveis normais (ou próximos do normal) nas primeiras 24 horas através de um protocolo de ressucitação precoce (ver a seguir).

1.4 Uso Prático (Fig. 1)

Dosar lactato em todo paciente com suspeita de sepse grave.

Em razão do elevado risco de choque séptico, todos os pacientes com lactato elevado (> 4 mmol/L ou > 36 mg/dL) devem receber o que se chama de “terapia precoce guiada por metas” (ver tópico 2.4), independentemente da pressão arterial que apresentem.

Monitore de perto e considere também o protocolo para todos os pacientes com lactato aumentado, seja qual for o valor.

Reposição volêmica agressiva é sempre o primeiro passo (e merece ser revisada periodicamente).

Seja generoso com a ressuscitação volêmica. Raramente, menos de 50 mL/kg de cristalóides serão suficientes para a ressuscitação nas primeiras 6 horas. Cuidado com a acidose hiperclorêmica por excesso de solução salina isotônica.

Considere o uso de variáveis dinâmicas que traduzem pré-
carga na reavaliação periódica da necessidade de ofertar mais volume.

Dosagens periódicas do lactato (por exemplo, a cada 2 a 6 horas) permitem inferir sobre a eficácia ou não das medidas adotadas (meta terapêutica).

1.5 Disponibilidade

A mensuração do lactato sérico deve estar disponível em sua instituição, com resultados rápidos (dentro de minutos), para tratar efetivamente pacientes sépticos graves. Um analisador de gases sangüíneos arteriais, localizado no laboratório clínico, habitualmente atende a essa necessidade. Entretanto, qualquer método de resultado rápido é aceitável. Se a análise não for imediata (poucos minutos), a amostra deverá ser acondicionada em recipiente com gelo. A técnica de obtenção de lactato por punção venosa tipicamente demora de 24 a 48 horas, necessita de coleta sem torniquete e, portanto, não é adequada para o cuidado de pacientes graves (utilizar arterial).

Dicas

  • Se a mensuração do lactato sérico não estiver disponível rapidamente na sua instituição, invista em equipamentos para tornar essa avaliação o mais rápido possível.
  • Crie protocolo padronizado para sepse grave que inclua a medida do lactato sérico.
  • Cuidado com as medidas de lactato nos hepatopatas graves. Correlacione valores elevados com outros dados da história e exame clínico.
  • Lembre-se de que o lactato é essencial para o diagnóstico de sepse grave (denota hipoperfusão tecidual), tem valor prognóstico e representa um dos marcadores da adequação da ressuscitação e/ou resposta ao tratamento. Níveis progressivamente menores e/ou nor malização, nas primeiras 24 horas, é sinal de bom prognóstico.
  • Lembre-se de que fatores indiretos diversos também podem interferir no gasto energético de pacientes graves e, conseqüentemente, nos níveis séricos de lactato (nível de sedação, agitação psicomotora, estado convulsivo, esforço respiratório, má adaptação à ventilação mecânica etc.). A abordagem desses fatores contribui para a normalização do lactato.

2. Hemocultura e outras culturas

2.1 Recomendação

Recomendamos colher amostras de sangue e outros materiais para exame microbiológico e culturas antes da administração de antibióticos, desde que não leve a um atraso significativo da administração dos antibióticos.

Recomendação forte (C)

2.2 Fundamentos

A incidência de sepse e bacteremia em pacientes graves tem aumentado nas últimas décadas. Dos pacientes com quadro clínico de sepse grave, 30% a 50% têm hemoculturas positivas. Desse modo, amostras de sangue devem ser obtidas para a realização de hemoculturas em todos os pacientes com suspeita de sepse grave.

Coletar as hemoculturas antes da administração de antibióticos oferece as melhores chances de identificar o microrganismo causador da sepse grave. A falha em coletar as hemoculturas antes da administração dos antibióticos pode afetar o crescimento de uma bactéria circulante e tornar os exames negativos posteriormente.

Estratégia de Coleta da Hemocultura

Para o diagnóstico, é importante a coleta de mais de uma amostra (mínimo de duas; três é o ideal), com intervalos de 5 minutos entre as punções, que devem ser realizadas emlocais diferentes. As punções podem ser tanto arteriais quanto venosas.

Coletas acima de quatro amostras não produzem maior índice de recuperação microbiana em diferentes estudos clínicos.

O laboratório de microbiologia trabalha basicamente em função da viabilidade dos microrganismos. Portanto, transportar as amostras imediatamente ao laboratório assegura melhor sobrevivência e isolamento do microrganismo.

O volume ideal corresponde a 10% do volume total do frasco de coleta. Quanto maior o volume de sangue inoculado no meio de cultura, por amostra, melhor recuperação do microrganismo, respeitando-se a proporção sangue/meio citada, pois o sangue em desproporção com o meio pode inibir o crescimento de microrganismos. Se possível, utilizar de10 a 20 mL por amostra e nunca refrigerar o frasco. Mantê-lo em temperatura ambiente.

A coleta e o transporte inadequados podem ocasionar falhas no isolamento do agente etiológico e favorecer o desenvolvimento de contaminação, acarretando o diagnóstico incorreto e a terapêutica inadequada.

Cateteres venosos ou arteriais inseridos há mais de 48 horas também podem ser fonte de infecção suspeita e culturas por esses cateteres devem ser adequadamente coletadas (Tabela 1).

Em pacientes com suspeita de infecção relacionada ao cateter, um par de culturas, através do cateter e de um sítio periférico, deve ser obtido simultaneamente. Se o mesmo organismo for identificado em ambas hemoculturas, a probabilidade de ser o agente causador é muito grande. A hora da coleta deve ser especificada nos frascos e nos pedidos de hemocultura. Se a cultura obtida do acesso vascular tornar-se positiva muito antes da cultura periférica (isto é, mais de 2 horas), o cateter é, possivelmente, a fonte da infecção.

O sistema de hemocultura trifásico permite o diagnóstico da infecção relacionada ao cateter intravascular, por meio da hemocultura quantitativa (retirar a mesma quantidade de sangue através do cateter vascular e punção periférica). As amostras devem ser identificadas quanto à origem (acesso central ou veia periférica). Suspeita-se de infecção relacionada ao cateter quando o crescimento de colônias na amostra do cateter for pelo menos cinco vezes maior que o da veia periférica.

Quando há manifestação clínica, tal infecção caracteriza-se pela presença de edema, dor, hiperemia, ocorrência ou não de secreção ao redor da região de inserção do cateter a sintomas de bacteremia durante a infusão por esse cateter. Nesse caso, o cateter deve ser retirado, e a cultura, realizada da porção mais distal do cateter (5 cm). Deve-se fazer anti-sepsia da pele antes da retirada do cateter. Contagens maiores de 15 UFC por campo estão mais associadas à infecção, embora a colonização não deva ser totalmente desconsiderada. Contagens abaixo disso estão associadas à colonização.

2.3 Indicações

Febre, calafrios, hipotermia, leucocitose, desvio à esquerda dos neutrófilos, neutropenia e desenvolvimento de disfunção orgânica inexplicável (por exemplo, falência renal ou sinais de comprometimento hemodinâmico) são indicações específicas para obter hemoculturas. Estas devem ser obtidas o mais rápido possível após o início da febre ou de calafrios.

Enquanto continua difícil prever bacteremias em pacientes com sepse, alguns parâmetros clínicos e laboratoriais estão independentemente associados à presença de bactérias no sangue de pacientes com suspeita de infecção. Estes incluem calafrios, hipoalbuminemia, desenvolvimento de insuficiência renal e diagnóstico de infecção urinária. Os outros critérios abrangem: novo episódio de febre, hipotermia, leucocitose com desvio à esquerda, neutropenia e sinais de comprometimento hemodinâmico. O pico de febre parece ser mais sensível que a leucocitose para predizer bacteremia; no entanto, a febre pode ser contínua nas bacteremias de baixo grau, como nas endocardites.


2.4 Outras culturas

Culturas de outros sítios como urina, secreção traqueal, líquor, feridas e outros fluidos corporais também devem ser obtidas quando pertinente. Entretanto, essas culturas devem sempre ser coletadas de forma quantitativa (ou semiquantitativa).

Culturas de secreção traqueal são recomendadas para o diagnóstico de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV). Muitos estudos têm demonstrado que culturas de secreção traqueal podem ser sensíveis, mas extremamente inespecíficas. Nesse aspecto, devem ser utilizadas culturas quantitativas, e a positivação, a sensibilidade e a especificidade variam de acordo com o método da coleta:

  • aspirado traqueal: > 106 ufc/mL, com sensibilidade de 38% a 82% e especificidade de 72% a 85%;
  • lavado broncoalveolar: > 104 ufc/mL, com sensibilidade de 42% a 93% e especificidade de 45% a 100%;
  • escovado protegido: > 103 ufc/mL, com sensibilidade de 33% a 100% e especificidade de 50% a 100%.

Os métodos invasivos não são livres de riscos (hipoxemia grave, hemorragia, arritmias), mas devem ser considerados em pneumonias rapidamente progressivas, pneumonias graves em pacientes intubados, imunocomprometidos e que não responderam à terapêutica empírica. Quando a broncoscopia não estiver disponível, o método não-invasivo deve ser utilizado para guiar a terapia antibiótica.

A escolha do método de coleta deve considerar a experiência local, a disponibilidade e o custo de cada procedimento.

A coloração pelo Gram deve ser utilizada para direcionar a terapêutica empírica inicial.

Aspirados traqueais negativos (ausência de bactérias ou células inflamatórias) em pacientes sem recente mudança na terapia antibiótica (nas últimas 72 horas) têm forte valor preditivo negativo (94%) para pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV). Outras causas de infecção devem ser investigadas.

Na suspeita de infecção por Legionella sp., a pesquisa de antígenos na urina pode ser utilizada e tem sensibilidade de 70% a 100% e especificidade de 100%.

Isolados fúngicos na urina representam, na grande maioria dos pacientes, somente colonização. Infecção urinária baixa devida à Candida é rara e deve ser tratada apenas em pacientes sem sondas vesicais. Outra situa ção em que o tratamento é considerado inadequado é a introdução de antifúngico baseada em culturas positivas isoladas de secreção traqueal, as quais representam, quase que invariavelmente, colonização de trato respiratório superior.

O potencial papel de biomarcadores para o diagnóstico de infecção em
pacientes com sepse grave continua ainda indefinido. O nível sérico de procalcitonina embora possa ser útil, sobretudo em pacientes neurológicos, muitas vezes se torna um problema em pacientes inflamados agudamente (por exemplo, pós-operatório, choque). No entanto, recentes evidências apontam o uso de procalcitonina para nortear a interrupção da antibioticoterapia. Essa estratégia tem sido associada ao menor tempo de antibióticos sem alterar desfechos clínicos.

Em um futuro próximo, métodos rápidos de diagnóstico (reação de cadeia de polimerase, micro-arrays) podem se revelar extremamente úteis para uma rápida determinação dos patógenos e determinantes de resistência bacteriana.


Dicas

  • Crie um protocolo padronizado para sepse grave que inclua lembretes para coleta de hemoculturas antes de administrar os antibió ticos.
  • Coloque avisos nos locais onde os antibióticos são armazenados questionando a equipe se as hemoculturas já foram coletadas.
  • Microrganismos contaminantes freqüentes: Estafilococos coagulase-negativa,Corynebacterium sp., Bacillus sp. (exceto B. anthracis), Proprionibacterium acnes,Clostridium perfringens.
  • O anticoagulante utilizado no meio de cultura (SPS) inativa o sistema de complemento, portanto inibe o crescimento de Neisseria sp. e Gardnerella vaginalis.
  • As bactérias com exigências especiais, como Brucella sp., Leptospira sp., Bartonella sp.,Legionella sp, Mycobacteria sp., não crescem nos meios tradicionalmente usados.

Bibliografia Recomendada

  1. Brasil. Ministério da Saúde. ANVISA. Manual de Procedimentos básicos em microbiologia clínica para o controle de infecção hospitalar.

3. Antibióticos

3.1 Recomendações

Recomendamos iniciar a terapia antibiótica endovenosa o quanto antes dentro da primeira hora do diagnóstico de choque séptico (Recomendação forte B) e sepse grave sem choque séptico (Recomendação forte D).

Culturas devem ser obtidas adequadamente antes de iniciar a antibioticoterapia, mas não deverão impedir a rápida administração dos antibióticos

Recomendação forte (D)

Recomendamos que a terapia antibiótica inclua uma ou mais drogas com atividade contra todos os patógenos prováveis (bactéria e/ou fungo) e tenha boa penetração no foco presumido de infecção em concentrações adequadas.

Recomendação forte (B)

Recomendamos que o regime de antibióticos seja reavaliado diariamente para otimizar a eficácia, prevenir o desenvolvimento de resistência bacteriana, reduzir a toxicidade de drogas e reduzir custos.

Recomendação forte (C)

Sugerimos terapia combinada empírica para pacientes com suspeita ou infecção conhecida por pseudomonas.

Recomendação fraca (D)

Sugerimos terapia combinada empírica para pacientes neutropênicos com sepse.

Recomendação fraca (D)

Quando utilizar empiricamente terapia combinada, sugerimos que a associação de antibióticos não ultrapasse três a cinco dias. O descalonamento para terapia única é o mais apropriado, tão logo a susceptibilidade do agente seja conhecida.

Recomendação fraca (D)

Recomendamos que a duração típica da terapia seja de sete a dez dias. Cursos mais prolongados podem ser adequados em pacientes que têm resposta clínica lenta, focos de infecção não-drenáveis ou que têm deficiências imunológicas incluindo neutropenia.

Recomendação forte (D)

Se a apresentação da síndrome clínica for determinada como não infecciosa, recomendamos que a terapêutica antimicrobiana seja interrompida imediatamente para minimizar a probabilidade de o paciente desenvolver um patógeno resistente ao antibiótico ou a um efeito adverso relacionado à droga.

Recomendação forte (D)


3.2 Fundamentos

Assim que a sepse grave for identificada, antibióticos devem ser iniciados rapidamente para tratar a infecção subjacente. Apesar de a administração precoce dos antibióticos parecer uma abordagem intuitiva, a instituição de uma terapia eficiente é freqüentemente retardada.

A avaliação das evidências sugere fortemente que a administração precoce de antibióticos apropriados reduza a mortalidade em pacientes com bacteremia por Gram-positivos e Gram-negativos. Parte da evidência está baseada no fato de que os pacientes que não receberam antibióticos de modo apropriado caracterizam um grupo no qual houve retardo na administração desses antibióticos. Diversos estudos confirmaram o benefício da antibioticoterapia apropriada nas infecções graves por bactérias Gram-negativas e Gram-positivas.

Adicionalmente, as principais fontes de sepse grave ou choque são pneumonias e infecções abdominais. As outras fontes, geralmente, somam menos de 5% dos casos. A prevalência das pneumonias como causa de sepse garante o argumento da administração precoce dos antibióticos. Em um estudo recente sobre pneumonia associada à ventilação mecânica, os pacientes com disfunção orgânica (critério para sepse grave) que receberam antibióticos mais tarde tiveram mortalidade na Unidade de terapia intensiva (UTI) muito maior: 37% vs. 7%, p = 0,006; mortalidade hospitalar: 44% versus 15%, p = 0,01.


3.3 Disponibilidade

Programar um suprimento de antibióticos previamente preparados no departamento de emergência ou na UTI para as situações de urgência é uma estratégia apropriada para aumentar a probabilidade de os antibióticos serem infundidos prontamente. A equipe deve estar ciente de que alguns medicamentos exigem uma infusão mais lenta, ao passo que outros podem ser administrados rapidamente ou mesmo em bolus.


3.4 Escolha dos antibióticos

A escolha dos antibióticos deve ser guiada pela sensibilidade dos patógenos mais comuns na comunidade e no hospital, tanto quanto nas informações específicas sobre o paciente, incluindo intolerância, doença de base e o cenário clínico. O esquema deve contemplar todos os patógenos prováveis procurando minimizar erros de cobertura de agentes mais comuns em pacientes graves. Há ampla evidência de que a falha na antibioticoterapia (por exemplo, terapia ativa contra o agente causador) tem efeitos adversos sobre o prognóstico.

Terapêutica inicial inadequada é definida pela ausência de um antimicrobiano direcionado a uma classe específica de microrganismos ou a administração de antimicrobiano cujo agente é resistente. Os patógenos mais comumente associados à administração de terapia inicial inadequada em pneumonias intra-hospitalares são bactérias Gram-negativas (P. aeruginosa,Acinetobacter sp., Klebisiella pneumoniae e Enterobacter sp.) e
S. aureus, especialmente os MRSA. Em pacientes com infecção da corrente sangüínea, os mais comuns são os Gram-positivos (S. aureus MRSA e coagulase-negativo, enterococos resistentes à vancomicina), Candida sp. e, menos comumente, Gram-negativos.

No entanto, restringir antibióticos, particularmente os de largo espectro, é importante para evitar superinfecção e diminuir o desenvolvimento de patógenos resistentes. Os pacientes com sepse grave e choque séptico necessitam de tratamento com antibióticos de largo espectro, até que o agente causador e a sensibilidade sejam definidos.

Estratificação de risco deve ser empregada para identificar infecções de alto risco para bactérias resistentes a antibióticos. Os fatores de risco incluem: uso prévio de antibióticos, tempo de internação prolongado, presença de dispositivos invasivos (cateter venoso central, tubo tra queal, sonda vesical etc.).

Esses pacientes de alto risco deverão receber, inicialmente, combinações de antibióticos que cubram os patógenos mais prováveis encontrados especificamente na unidade de terapia intensiva em que estão internados. Tal cobertura inicial poderá ser potencialmente modificada, se o espectro do agente for excluído baseado em dados clínicos laboratorias específicos (por exemplo, coloração pelo Gram associado ao sítio de infecção). A terapia empírica deverá sempre ser modificada, uma vez que o agente seja identificado, ou até mesmo descontinuada, se o diagnóstico de infecção se tornar completamente improvável.

Ao escolher a terapêutica inicial, deve-se igualmente ponderar se cândida é um provável patógeno. Quando for necessário selecionar um agente antifúngico empírico (por exemplo, fluconazol, anfotericina B ou equinocandinas), deve-se considerar a prevalência local de espécimes de cândida resistentes a azois (por exemplo, c. glabrata e c. krusei) e o uso prévio dessas drogas em profilaxia. Fatores de risco para candidemia também devem ser avaliados. A prática da estratégia de descalonamento de antibióticos permite instituir terapêutica inicial ampla e adequada no tratamento de pacientes de alto risco e evita, posteriormente, a utilização desnecessária de antibióticos e conseqüente indução de resistência.


3.5 Reavaliação em 48 a 72 horas

Assim que o agente causador e a sensibilidade antibiótica forem identificados, a restrição do número e do espectro de ação dos antibióticos será uma estratégia importante para reduzir o desenvolvimento de patógenos resistentes e para contenção de custos.

O esquema antibiótico deve sempre ser revisto depois de 48 a 72 horas, com base nos dados microbiológicos e clínicos, a fim de reduzir o espectro, prevenir a resistência, reduzir a toxicidade e os custos. Assim que o agente causador for identificado, não existe evidência de que o tratamento combinado seja mais eficiente que a monoterapia.
A duração do tratamento deve ser tipicamente de sete a dez dias e guiada pela resposta clínica.


Doses

Todos os pacientes devem receber uma dose de ataque completa de cada antibiótico. No entanto, os pacientes com sepse ou choque séptico, freqüentemente, apresentam função renal e hepática anormal e podem ter volumes de distribuição alterados pela reposição volêmica agressiva. O farmacêutico da UTI deve ser consultado para garantir que as concentrações séricas sejam obtidas com o máximo de eficiência e menor toxicidade.4. Controle do foco infeccioso


4.1 Recomendações

Recomendamos que um diagnóstico anatômico específico da infecção seja investigado e diagnosticado ou excluído tão rapidamente quanto possível, principalmente focos emergentes que exigem atenção especial para o controle (por exemplo, fasceíte necrotizante, peritonite difusa, colangite, isquemia intestinal) (Recomendação forte C), e dentro das primeiras 6 horas após apresentação (Recomendação forte D).

Recomendamos, ainda, que todos os pacientes com sepse grave sejam avaliados quanto à presença de um foco de infecção abordável por medidas de controle específicas como drenagem de abscessos, desbridamento de tecidos necróticos infectados, remoção de dispositivos potencialmente infectados ou o controle definitivo de uma fonte de manutenção da contaminação microbiana.

Recomendação forte (C)

Sugerimos que quando for detectada necrose peripancreática infectada como fonte de infecção, a intervenção definitiva seja postergada até que uma melhor delimitação de tecidos viáveis e não viáveis ocorra.

Recomendação fraca (B)

Recomendamos que a intervenção com menor insulto fisiológico seja utilizada quando o controle da fonte de infecção é necessário, por exemplo, drenagem percutânea de abscesso em vez de drenagem cirúrgica.

Recomendação forte (D)

Recomendamos que quando um dispositivo de acesso vascular
for uma possível fonte de sepse grave ou choque séptico ele seja imediatamente removido após estabelecido um outro novo acesso.

Recomendação forte (C)


4.2 Fundamentos

Todo paciente séptico deve ser avaliado quanto à presença do foco infeccioso, e medidas devem ser tomadas para o seu controle, especificamente drenagem de abscessos, desbridamento de tecidos necróticos, remoção de potencial dispositivo infectado (por exemplo, cateteres) e controle definitivo de uma fonte contínua de contaminação microbiana (Tabela 3).

Nesse contexto, devem ser acionados especialistas de outras disciplinas como radiologia, cirurgia, pneumologia, gastroenterologia, para diagnosticar e drenar, desbridar e remover apropriadamente a fonte de infecção.

A escolha do melhor método de controle deve pesar o risco-benefício de cada intervenção. Complicações como sangramentos, fístulas e lesão inadvertida de órgãos devem ser consideradas, e as intervenções de menor risco devem ser empregadas, como, por exemplo, drenagem percutânea de um abscesso em substituição à drenagem cirúrgica.

Quando identificado um foco de infecção como perfuração gastrintestinal, colangite ou isquemia intestinal, com deterioração fisiológica aguda, a intervenção deve ser instituída precocemente, seguida da restauração do quadro o mais cedo possível.

Se o acesso intravascular for potencialmente a fonte de infecção, mesmo que seja um cateter tunelizado ou implantado cirurgicamente, ele deverá ser prontamente removido, após a instalação de um novo acesso.


Tabela 3:
Controle da fonte de infecção

Técnica de Controle da Fonte

Exemplos

Drenagem

• Abscesso intra-abdominal

• Empiema pleural

• Artrite séptica

• Pielonefrite

• Colangite

Debridamento

• Necrose pancreática infectada

• Isquemia intestinal

• Mediastinite

Remoção de dispositivos

• Cateter vascular infectado

• Sonda urinária

• Cânula traqueal colonizada

• Dispositivo intra-uterino infectado

Controle definitivo

• Ressecção de sigmóide por diverticulite

• Colecistectomia por colangite necrotizante

• Amputação devida à mionecrose porclostridium


. Exames de imagem


5.1 Recomendação

Recomenda-se realizar prontamente exames de imagem na tentativa de confirmar potenciais fontes de infecção. Amostras de materiais de focos identificados devem ser obtidas à medida que são diagnosticados, no entanto alguns pacientes podem estar demasiadamente instáveis para justificar determinadas técnicas invasivas ou transporte para fora da UTI. Nessas circunstâncias, procedimentos à beira-leito e menos invasivos, como a ultra-sonografia, podem ser úteis.

Recomendação forte (C).


5.2 Fundamentos

Exames de imagem podem identificar uma fonte de infecção que exige a retirada de um corpo estranho ou a drenagem de uma coleção para maximizar a probabilidade de uma resposta satisfatória terapêutica. Contudo, mesmo nos hospitais mais organizados e bem equipados, o transporte de pacientes pode ser perigoso, expondo o paciente a permanecer em unidades de imagem que são de difícil acesso e com monitorização inadequada. Equalizar os riscos e benefícios é, portanto, obrigatório nessas situações.


Dicas

  • Atualmente, há uma tendência mundial crescente para que exames como a ultra-sonagrafia portátil sejam realizados à beira-leito pelos própios intensivistas, não para gerar laudos complexos, mas para um diagnóstico rápido e para guiar uma abordagem menos invasiva, como drenagem percutânea, por exemplo.
  • Esta realidade começa a chegar ao Brasil e já estão disponíveis centros de treinamento para capacitação de intensivistas para realização desses procedimentos em São Paulo e Porto Alegre.

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